segunda-feira, 27 de outubro de 2008

LANCE FORA O MEDO


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Quase todos os Paladinos da justiça (negros ou não) têm um antecessor que vem adiante propondo aos seus súditos/protegidos uma recepção à altura, e anunciando que aquele que virá efetuará algo novo... E quase sempre também, possuem um ferrenho opositor.
Neste novo filme de Batman - O Cavaleiro das Trevas, o coringa ultrapassa o limite de antagonista e execra a própria existência e a do seu arquiinimigo. É um filme que conta à história de um homem amedrontado no passado e movido pela vingança no presente, onde o medo é a mola que proporciona movimento e energia. Bruce Wayne/Batman é o indivíduo que busca na realização do seu desejo a sublimação de sua dor passada e que acaba por produzir, nos outros, o que ele mesmo experimentou: medo. Depois desse filme não sei mais se podemos chamá-lo de super herói, não no sentido lato da palavra. Já o coringa é a própria alegoria da ameaça e da falta de motivos para uma desgraça; ele é o próprio terror vivo, o que faz os marginais de Gothan acreditarem ser ele o único capaz de infringir ao inimigo o mesmo dano psicológico que lhes sobrevêm. Temos, a partir daí, um espetáculo de crueldade, onde o medo é a entrada, o prato principal e a sobremesa; onde o coringa é quase um filósofo que justifica suas atitudes pelo simples desejo de gerar o caos. Um dos diálogos mais marcantes do filme é aquele em que ele afirma que a morte de soldados numa guerra ou de um indigente qualquer é totalmente aceitável, mas que se alguém resolve balear um prefeitinho qualquer, toda a sociedade se choca e se indigna. É algo que faz pensar: será que nos comovemos com a morte pura e simplesmente ou apenas com a morte de nossos iguais, daqueles que participam de nossa "casta social"?[2] O medo da morte é algo muito comum em todos os lugares e épocas, mas, além disso, o filme Batman - O Cavaleiro das Trevas passa-nos uma idéia de que o medo é um possível catalisador da moderna rebeldia.

“O mundo perdeu a lógica e, ao perdê-la, perdeu a ética. Ou podemos ler a frase ao contrário: ao perder a ética, que já era pouca, perdeu a lógica. A ética é a ligação entre os homens e os deuses, entre a fé e a razão. Não é preciso ser religioso para ser ético. Basta respeitar a vida, como a têm respeitado a maioria dos seres humanos e algumas de suas organizações filantrópicas.” [3]

Olhando para o medo, pelo prisma bíblico, vemos que é uma emoção que impede os homens de assumirem suas responsabilidades; o medo é desagregador e começou no Jardim do Éden assim que o pecado entrou no mundo, produzindo o primeiro covarde da história, Adão (que lançou sobre Eva toda a culpa de sua desobediência). A consciência de culpa, ou ainda, a vergonha e medo pelo erro cometido são o resultado direto do pecado original cometido por Adão[4]. É este medo que faz as pessoas desconfiarem dos outros, suspeitarem mal, não enfrentarem os seus problemas e até impedir os relacionamentos. O medroso não se move, não faz, não é capaz de desempenhar seu papel social. Não ama e nem perdoa.
O medo bloqueia o nosso acesso até Deus e nos obriga a buscarmos soluções para a nossa vida longe Dele. E esta não submissão a Deus é REBELDIA!
Ultimamente um medo generalizado assola o mundo; as fobias cada vez mais se multiplicam em razão do estresse e da angústia provocados pela desorganização da vida e do medo produzido pela violência e total falta de paz. Some a isto a busca frenética do sucesso e a ansiedade típica do homem moderno, e acabamos por fabricar a doença mais difundida do nosso século: MEDO!
Quando olhamos para a filosofia vemos que um caráter virtuoso define a relação do indivíduo com a sociedade, gerindo a sua vida pública; no Cristianismo, o caráter define, primeiramente, sua relação com Deus (Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, Mt. 22.37) e depois com o seu semelhante (Amarás o teu próximo como a ti mesmo, Mt. 22.39), fazendo da fé e do amor as virtudes mais importantes. É o amor praticado entre irmãos, amigos e ao próximo que lança fora todo o medo!
A partir daqui devemos enfatizar a integridade, pois é a virtude mediante a qual uma pessoa e seus atos são irrepreensíveis, íntegros, honestos, incorruptíveis. Voltando ao filme, vemos que Batman e coringa digladiam-se em um dilema moral e que não conseguem ir além da busca de realização própria, pois não conseguem enxergar a reputação imaculada que estanca o medo.
Mas integridade (caráter) não é reputação. D. L. Moody disse que o caráter é o que o homem é na obscuridade, quando está sozinho. Infelizmente nossa geração acha difícil distinguir caráter de reputação; e isto é tudo o que vale hoje em dia, ter uma reputação. Ser o “tal”, o “cara”. Será preciso lembrar que a concretização dos nossos sonhos depende mais da nossa integridade do que da nossa reputação? No livro de Provérbios (11.3 ARA), lemos que “A integridade dos retos os guia; mas, aos pérfidos, a sua mesma falsidade os destrói”[5]
A Bíblia ao relatar o testemunho da vida de José nos mostra esta possibilidade, de um homem manter-se, sob a graça divina, íntegro, independente da idade e das circunstâncias que o envolvam. Assim como Jesus, José sempre evidenciou as virtudes próprias de um caráter forjado pela adversidade e perseverança no Senhor. Logo, o caráter abrange tudo o que pensamos, falamos e fazemos, aprendemos e vivemos. Ele revela nossa completa identidade. Por isso, José venceu as agruras e vicissitudes, e de igual modo Cristo padeceu por nós, como um servo piedoso e temente a Deus, humilde e abnegado; Ele estava disposto a fazer sempre à vontade Daquele que lhe enviou!
Nós, crentes, sabemos que sem fé é impossível agradar a Deus, e também sabemos que a fé sem obras é morta; ora, praticar a fé amando o próximo agrada e muito a Deus, porque demonstramos amor e crença a tudo que Ele representa através de um relacionamento virtuoso com outras pessoas, quer professem ou não a mesma fé. A falta de fé e de amor prático faz com que o crente seja dominado pelo medo de fracassar em diversas áreas da vida, seja profissional, acadêmica, ministerial, familiar, etc. Precisamos lembrar que a declaração angélica: “Paz na terra, boa vontade para com os homens” (Lc. 2.14b), é um convite a extinção do medo, pela correta aplicação do perdão e ajuda mútua, e que a Bíblia nos dá ensinamento quanto a isto e base moral para todos os cristãos, quando revela o que Jesus disse: “Portanto, tudo o que vós quereis que os homens vos façam, fazei-lho também vós” (Mt. 7.12).
Finalizando, segundo o Dicionário digital Aulete, medo é:

1- Sentimento inquietante que se tem diante de perigo ou ameaça; FOBIA; PAVOR; TERROR: Ele tem medo de tempestades.
2- Ansiedade diante de uma sensação desagradável, da possibilidade de fracasso etc.; RECEIO; TEMOR: Tinha medo de ser abandonada pelo marido. [ Antôn.: calma, despreocupação.]
Atitude covarde; POLTRONARIA: Fugiu por medo de apanhar. [ Antôn.: bravura, coragem.]



1 - A imagem que ilustra este texto foi tirada da Capa de Batman #639, publicado por DC Comics (2005), escrito por Judd Winick, arte da capa por Matt Wagner; reimpresso em Batman: Under the Hood trade paperback (2005).
2 - http://heresialoira.com/2008/07/o-panteo-dos-viles-inesquecveis-ganhou.html
3 - http://1quartodeseculo.blogspot.com/2008/07/um-momento-para-o-silncio.html
4 - TEOLOGIA SISTEMÁTICA, Louis Berkhof, editora Cultura Cristã, 2004, pág. 209.
5 - Extraído de QUEM É VOCÊ PARA JULGAR?, LUTZER, E. W., Rio de Janeiro, CPAD, 2005, pág. 236-7.

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